Publicado: 16/10/24 às 08h25
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A infância é uma fase de descobertas. É quando a criança começa a aprender, e esses aprendizados vão dos mais básicos aos mais complexos. É uma fase de descoberta das cores, dos cheiros, dos sons, das texturas das coisas. É quando começa a fazer conexões, desenvolver habilidades motoras, criar vínculos, desenvolver emoções, criar hábitos. E a alimentação tem um papel de extrema importância nessa fase, não só na parte nutricional, mas também para o crescimento e desenvolvimento pleno dessa criança.
Segundo Sônia Venâncio, do Instituto de Saúde Pública da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, a alimentação adequada e saudável nos primeiros 2 anos de vida vai garantir que a criança receba todos os nutrientes necessários para o seu crescimento e também o seu desenvolvimento. E a nutrição adequada tem um impacto importante na saúde. As crianças desnutridas têm um risco maior de adoecer, o que acaba impactando, inclusive, na mortalidade infantil.
Do outro lado, o excesso também é prejudicial. As crianças com excesso de peso também têm um risco maior de adoecer e de desenvolver doenças crônicas como hipertensão e diabetes. Alcançar um estado nutricional adequado significa encontrar um equilíbrio, sendo um dos pilares mais importantes para garantir o desenvolvimento pleno das crianças.
E quando se fala em desenvolvimento, Sônia explica que é fundamental considerar aspectos da aprendizagem, os cognitivos, o desenvolvimento da linguagem, das habilidades motoras e socioemocionais. “As crianças com desnutrição crônica têm um risco muito grande de não alcançarem esse pleno desenvolvimento. Além disso, o início da vida é o período de formação dos hábitos alimentares. Ter uma alimentação saudável nesse momento vai também aumentar a chance dessa criança continuar uma alimentação saudável posteriormente, na vida adulta”, explica a profissional.
Olhando por esse lado, a alimentação na infância é um investimento para o futuro. Afinal, criar hábitos saudáveis neste momento, faz com que eles tenham maior probabilidade de serem mantidos ao longo da vida. E isso também acaba sendo um fator positivo para prevenir doenças em todas as idades, em especial as crônicas. Seguindo nessa linha, o Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de 2 anos, produzido pelo Ministério da Saúde, alerta que o consumo precoce de açúcar aumenta a chance de ganho de peso excessivo durante a infância e, consequentemente, o desenvolvimento de obesidade e outras doenças na vida adulta.
Por esse motivo, a recomendação é de não ofertar açúcar e produtos que contenham esse ingrediente nos 2 primeiros anos de vida, uma vez que este alimento contribui para a formação de hábitos alimentares não saudáveis. Esse esforço é ainda mais importante para não estimular um paladar que já é naturalmente doce desde o nascimento. Se a criança for acostumada com preparações doces, poderá ter dificuldade em aceitar verduras, legumes e outros alimentos saudáveis. A criança que come alimentos saudáveis e adequados quando pequena tem mais chances de se tornar uma pessoa adulta consciente e autônoma para fazer boas escolhas alimentares.
O que é essa alimentação adequada e saudável no início da vida?
O primeiro contato das crianças com a comida de verdade acontece por meio do leite materno. Oferecer uma alimentação adequada e saudável desde o início da vida significa começar com o aleitamento materno exclusivo pelos primeiros 6 meses de vida da criança. Segundo Sônia, ele deve começar logo após o nascimento do bebê, na primeira hora de vida, e continuar exclusivamente nos primeiros 6 meses. Até esse período, o leite materno é capaz de suprir todas as necessidades da criança. Sendo assim, não há necessidade de ofertar nenhum outro alimento ou líquido. Nem mesmo água.
Após o sexto mês, deve-se começar a introdução dos alimentos complementares ao leite materno. Para que a alimentação continue sendo saudável e adequada, os alimentos oferecidos devem ser in natura ou minimamente processados. Essa deve ser a base da alimentação da criança. Dentro desse universo da comida de verdade, é importante respeitar a cultura alimentar da região. “Oferecer os in natura respeitando a diversidade e a riqueza que a gente tem nas diferentes regiões do Brasil”, explica a profissional.
Porque não oferecer os ultraprocessados?
Além do açúcar mencionado anteriormente, que está presente em praticamente todos os ultraprocessados, esses tipos de alimentos são prejudiciais para a saúde da criança por serem ricos também em sal, gorduras e aditivos químicos. O excesso desses ingredientes coloca em risco não apenas a saúde da criança, mas também dos adultos.
E os ultraprocessados têm um forte aliado: a publicidade. Segundo Sônia, esse é um dos principais obstáculos para conseguir oferecer uma alimentação saudável para as crianças. “Elas são vítimas, na verdade, dessa propaganda. Elas não têm a capacidade de saber o que é melhor para elas. Então elas são muito influenciadas pelos personagens que apresentam esses produtos. São influenciadas também por brindes. É muito importante que os adultos e cuidadores protejam a criança e não a exponha a esses estímulos da mídia”, orienta a especialista.
Mas até mesmo os adultos podem ser confundidos. Muitos desses produtos passam a falsa ideia de que são saudáveis, pois afirmam ser enriquecidos com vitaminas, minerais, entre outros. Os pais ou responsáveis podem acabar achando que estão favorecendo a nutrição dos pequenos. Por esse motivo, Sônia orienta que é importante também esclarecer os adultos sobre os riscos dos ultraprocessados.
Como as refeições do dia a dia podem ser pensadas?
Segundo Sônia, o momento da refeição deve ser agradável e prazeroso para a criança e sua família. É um momento de convivência. Dessa forma, o ideal é que se alimente junto com a família em um ambiente tranquilo e sem distrações. Comer com atenção é importante em qualquer fase da vida, mas no caso das crianças esse é um momento de estímulo. É quando ela vai poder explorar as cores dos alimentos, as diferentes texturas e sabores.
Conforme explica o Guia Alimentar, além do paladar, a oferta de novos alimentos também envolve o tato. O uso das mãos é fundamental para o desenvolvimento de diferentes habilidades, como tocar o próprio corpo, pegar objetos, senti-los e soltá-los. Sendo assim, no momento das refeições é importante deixar a criança usar as mãos para tocar os alimentos e sentir as diferentes texturas, ou mesmo a levar os alimentos até perto do nariz para sentir os cheiros e depois levá-los à boca. Ou mesmo deixá-la usar as mãos para pegar a colher. Ainda que o faça de forma um pouco desajeitada, isso torna o momento mais interativo e estimula a criança a se alimentar sozinha, mesmo que ainda não consiga.
Sobre o cardápio, é importante também pontuar que a criança não precisa comer um cardápio diferente da família. Muito pelo contrário! A criança também aprende a comer vendo o que os adultos comem. Portanto, desde que seja uma refeição baseada em alimentos in natura e minimamente processados, a mesma comida pode ser consumida pelos pequenos. O que vai variar é apenas a consistência e a quantidade, a depender da faixa etária da criança.
Sobre o Guia Alimentar do Ministério da Saúde
O Guia Alimentar para a População Brasileira é um instrumento para apoiar e incentivar práticas alimentares saudáveis no âmbito individual e coletivo. Foi feito para todos os brasileiros e brasileiras! Ele reúne um conjunto de informações e recomendações sobre alimentação que contribuem para a promoção da saúde de pessoas, famílias e comunidades e da sociedade como um todo, hoje e no futuro.